A Polícia Federal vê
fortes indícios de que ao menos 12 empresas negociaram ou pagaram propina para
reduzir e, em alguns casos, zerar débitos com a Receita Federal.
A Folha teve acesso à
relação dos 74 processos que estão na mira da PF. Cada uma das empresas tem
diferentes níveis de envolvimento no esquema de compra de sentenças desvendado
pela Operação Zelotes, deflagrada na semana passada.
Segundo
investigadores, muitas subornaram integrantes do Carf (Conselho Administrativo
de Recursos Fiscais), colegiado responsável por julgar, em segunda instância,
recursos de contribuintes autuados pela Receita. Outras, porém, foram
procuradas por facilitadores que intermediavam o suborno a conselheiros do
órgão, mas ainda não há contra elas elementos que comprovem o pagamento da
propina.
Os casos que os
investigadores consideram ter indícios mais consistentes atingem processos dos
grupos Gerdau e RBS; das companhias Cimento Penha, Boston Negócios, J.G.
Rodrigues, Café Irmãos Julio, MundialEberle; das empresas do setor automotivo
Ford e Mitsubishi, além de instituições financeiras, como Santander e Safra.
As companhias negam
irregularidades.
Embora o nome do
Bradesco também esteja nessa lista, até agora os policiais conseguiram detectar
apenas que funcionários do banco foram procurados por consultorias que
intermediavam o acesso aos conselheiros do Carf.
A Folha apurou que,
para o Ministério Público, até o momento os casos em que há indícios mais
fortes de eventuais irregularidades envolvem a RBS e o grupo Gerdau.
O esquema de
sonegação, de acordo com as investigações, é um dos maiores já identificados no
país. O Carf julga hoje processos que correspondem aproximadamente a R$ 580
bilhões.
Além das empresas, a
apuração chegou a nomes de lobistas que faziam a ponte entre os contribuintes e
os conselheiros suspeitos de integrar o esquema. Um deles é Alexandre Paes do
Santos.
Segundo policiais,
ele teria sido sócio de um dos conselheiros investigados. De acordo com a
apuração, eles criaram uma consultoria justamente para fazer o meio de campo
entre as empresas e a parcela do colegiado que recebia propina.
A PF cumpriu mandado de busca e apreensão na
casa e no escritório de Alexandre Santos. O empresário ainda não foi
localizado.
Procurada, a assessoria
de imprensa da PF informou que não comenta investigações que correm sob sigilo.
CADEIRA
NO CONSELHO
Um aspecto do
funcionamento do Carf chamou a atenção do Ministério Público. "Havia uma
série de advogados pleiteando uma cadeira no conselho, embora a função não seja
remunerada" , diz o procurador federal Frederico Paiva, responsável pelo
caso.
Os 74 processos da Zelotes somam R$ 19
bilhões. A PF diz que "já foram, efetivamente, identificados prejuízos de
quase R$ 6 bilhões".
Mais de R$ 2 milhões foram apreendidos em
Brasília e em São Paulo pela PF. Segundo balanço divulgado na sextafeira (27),
além de dinheiro (R$ 1,8 milhão, US$ 9.000 e € 1.500), foram apreendidos em
Brasília 16 carros nacionais e importados, além de joias.
Em São Paulo, foram
apreendidos dez veículos e R$ 240 mil (em moeda nacional e estrangeira), e, no
Ceará, dois veículos.
COMPANHIAS
DESCARTAM IRREGULARIDADES
Contactadas pela
Folha, as empresas que estão na mira da Polícia Federal negaram irregularidades
no esquema de compra de sentenças no Carf.
A RBS informou que
desconhece a investigação e negou qualquer ilegalidade em suas relações com a
Receita Federal. A empresa acrescentou que confia na atuação das instituições
responsáveis pela apuração para o devido esclarecimento dos fatos.
A Mundial disse
desconhecer a informação e não ter nada a se pronunciar.
A Gerdau disse que
não foi contatada por nenhuma autoridade pública e que possui rigorosos padrões
éticos na condução de seus pleitos junto aos órgãos públicos.
A Mitsubishi não irá se
manifestar, neste momento, em relação ao caso.
O Santander informou
que tomou conhecimento do caso pela imprensa e acrescentou que sua defesa é
sempre apresentada de forma ética e em respeito à legislação. "Informamos,
ainda, que estamos à disposição dos órgãos competentes para colaborar com
qualquer esclarecimento necessário."
O Bradesco informou que não irá se pronunciar.
A Ford não respondeu até a conclusão desta edição.
As empresas JG
Rodrigues, Café Irmãos Júlio e Cimento Penha não foram localizadas pela
reportagem.
O Bank of America,
que vendeu a operação latinoamericana do BankBoston para o Itaú, também não se
pronunciou. Na operação, o Itaú ficou apenas com os clientes e as agências; o
nome BankBoston, os créditos e os débitos tributários não fizeram parte do
negócio.
O Safra não respondeu
aos pedidos de entrevista.
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