Por Joice Bacelo
Fonte: Valor Econômico
O uso de prejuízo fiscal para o
abatimento de débitos tributários, um dos principais atrativos do recém-lançado
Programa de Regularização Tributária (PRT), vem sendo motivo de discussão na
Justiça. Contribuintes que aderiram a Refis anteriores reclamam da demora do
Fisco em concluir a análise de tais créditos – o que acaba deixando a dívida em
aberto mesmo anos após inclusão no programa.
Um dos problemas gerados pela
situação é que os contribuintes são obrigados a manter a garantia da dívida –
que, por lei, deve ser preservada até a liquidação do débito. Geralmente
seguros e fianças, que têm altas taxas de manutenção. Além disso, com o débito
em aberto, o contribuinte enfrenta dificuldades em obter a certidão de
regularidade fiscal.
Essa é a situação, por exemplo, de
uma multinacional do setor de seguros. A companhia aderiu ao parcelamento da
Lei nº 12.865, em 2013, e ainda não teve concluída a análise dos prejuízos
fiscais e das bases negativas da CSLL oferecidos no pagamento. Parte do débito
foi paga à vista.
Só agora, por meio de uma liminar da
22ª Vara Federal de São Paulo, é que o reconhecimento dos créditos poderá
ocorrer. O juiz José Henrique Prescendo estabeleceu 60 dias para a Receita
Federal analisar de forma conclusiva a suficiência dos prejuízos e bases
negativas da companhia.
Na decisão, o magistrado destaca que
o artigo 24 da Lei nº 11.457, de 2007, estabelece prazo máximo de 360 dias para
que sejam proferidas decisões administrativas, defesas ou recursos dos
contribuintes. "Já perfaz tempo razoável desde o protocolo do requerimento
administrativo, sendo dever legal da administração pública pronunciar-se dentro
de um prazo razoável sobre os pedidos que lhe são apresentados, zelando pela
boa prestação de seus serviços", disse.
Representantes da empresa no caso, os
advogados Marcelo Annunziata e Katia Zambrano, do Demarest, dizem que a Receita
já havia confirmado, no processo de execução fiscal da dívida, que tanto a
parte paga em dinheiro como os créditos acumulados eram suficientes para a
quitação. "Falta apenas um sistema eletrônico para alocar o crédito ao
remanescente do débito", diz a advogada.
O tributarista Sandro Machado dos
Reis, do Bichara Advogados, chama a atenção que situações como essa ocorrem com
frequência nos programas de parcelamento. Principalmente porque a lei não fixa
prazo para a consolidação do débito. "Existem outras decisões
similares", destaca.
Ele acrescenta que há jurisprudência
no Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que se a demora em analisar superar
360 dias, considera-se que o Fisco está em mora.
Machado acredita que o problema deve
se repetir no PRT. Isso porque a Medida Provisória (MP) que instituiu o
programa, de nº 766, também não fixa prazo para a consolidação dos débitos.
"A tendência é que os contribuintes mais uma vez precisem ir à Justiça
para dar fim aos débitos incluídos nesse programa", diz.
Para os advogados Luca Salvoni e
Rafael Vega, do Cascione, Pulino, Boulos & Santos, há um
"descasamento" entre a percepção do legislador e a capacidade da
Receita de processar o volume de informações geradas com os programas de
parcelamento – que, entendem, têm cada vez regras mais complexas e apuração
mais difícil.
"Muitas vezes a Receita não consegue cruzar o
débito do contribuinte com os que foram escolhidos para o programa", diz
Salvoni. "O contribuinte escolhe entre todos os seus débitos quais ele
quer inserir no programa e quais desses ele quer ou não pagar com créditos. Há
várias formas e uma delas é a compensação. Então se soma tudo isso, faz uma
equação supercomplexa e na prática o sistema não consegue processar",
afirma.
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