Fonte: Valor Econômico
Decisão
do Supremo em repercussão geral foi dada por maioria de votos
O
Supremo Tribunal Federal (STF) definiu ontem uma questão que poderá afetar o
caixa dos Estados. Os ministros entenderam que os governos estaduais são
obrigados a devolver o ICMS recolhido a mais por meio do sistema de
substituição tributária, quando um produto for comercializado ao consumidor
final abaixo do valor fixado pela Fazenda (presumido).
Isso
significa que os valores presumidos e recolhidos de forma antecipada não serão
mais definitivos. A tese muda entendimento que vinha sendo seguido pela Corte
desde 2002. A jurisprudência, até então, era que a restituição seria devida
somente nos casos em que a operação presumida não tivesse se concretizado.
O
precedente, julgado em repercussão geral, deve orientar todos os litígios
pendentes e os casos futuros. Estavam sobrestados cerca de 1,3 mil processos
sobre o tema. A matéria retornou à pauta em sessão extraordinária ocorrida na
manhã de ontem - para compensar o feriado de 12 de outubro - e foi concluída no
período da tarde.
No
regime de substituição tributária, a companhia antecipa o pagamento do imposto
para todas as empresas que fazem parte da cadeia produtiva. Caso, por exemplo,
dos setores de automóveis, bebidas, combustíveis e farmacêutico. O cálculo do
tributo se baseia em um valor de venda pré-estipulado (presumido). Por essa
razão é que se discutiu se o contribuinte teria direito à diferença quando o
produto é comercializado abaixo do valor presumido.
Especialistas
na área acreditam que esse novo entendimento do STF pode provocar duas
situações: queda de arrecadação por Estados que não previam essa situação São
Paulo e Pernambuco seriam os únicos que já estariam adequados à nova
jurisprudência e também um aumento da quantidade de litígios sobre o tema.
"Dificilmente
a base de cálculo presumida será semelhante à real, de maneira que em
praticamente todas as operações deverá ocorrer um acerto de contas", disse
o tributarista Sergio Villanova Vasconcelos, do escritório Peixoto & Cury
Advogados. "Nesse cenário, precisamos observar como os Fiscos estaduais
vão reagir a essa decisão e ajustar a legislação fiscal para se adequar às
novas regras."
As
regras da substituição tributária, segundo o advogado Douglas Mota, do escritório
Demarest, são baseadas por percentuais utilizados com base em pesquisas que os
Estados fazem e costumam ter margem de valor agregado muito alta. "Isso
significa que pode acontecer de muitos valores terem que ser devolvidos. Então,
o impacto talvez seja a redução da arrecadação", afirmou. "Essa
decisão tem o poder de equalizar a carga tributária."
O
caso analisado pelos ministros do Supremo envolve a empresa Parati Petróleo e o
Estado de Minas Gerais. Chegou à Corte depois de a empresa contestar acórdão do
Tribunal de Justiça mineiro (TJMG), que havia julgado pela impossibilidade da
restituição dos valores recolhidos.
No
Supremo, o placar foi de sete votos em favor da mudança de jurisprudência e
três contrários. Posicionaram se pela possibilidade de restituição ou
complementação dos valores presumidos o relator, Edson Fachin, e os ministros
Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio, Cármen Lúcia e
Ricardo Lewandowski. A discussão se deu com relação ao parágrafo 7º do artigo
150 da Constituição. O dispositivo estabelece a restituição nos casos em que
não serealiza o fato gerador presumido.
A
maioria dos ministros entendeu que o fato gerador presumido não se concretiza
quando não é realizado, mas também nos casos em que existe diferença entre o
que foi pago de forma antecipada e o valor real. A tese estaria, então,
contemplada pelo que determina a Constituição. O ministro Edson Fachin
complementou, na sessão de ontem, que a Constituição Federal também não
autoriza o Estado a cobrar tributos a mais. "Não se pode preservar o
enriquecimento sem causa, seja de um lado ou do outro", disse.
Para
o ministro Teori Zavascki, que abriu a divergência, porém, o entendimento que
permite a modificação de valores estaria esvaziando o conceito da substituição
tributária. "Se estará inviabilizando o próprio instituto", afirmou.
Segundo Zavascki, a substituição tributária tem caráter prático porque facilita
a fiscalização de setores difíceis de monitorar.
O
ministro Dias Toffoli seguiu o voto divergente por entender que traria mais
segurança jurídica. "É uma solução mais prática e entendo que traz menos
conflituosidade e pacifica o tema", afirmou durante o julgamento. Já o
ministro Gilmar Mendes considerou a questão da crise financeira enfrentada
pelos Estados. "Vamos desarrumar um sistema que funciona. E não é o
momento de acender um fósforo pra ver se tem gasolina no tanque."
Em
defesa da mudança, o ministro Luís Roberto Barroso rebateu ao afirmar que a legislação
de São Paulo que prevê a restituição dos valores pagos a mais está vigente
desde 2006. Os ministros estariam, neste caso, não mudando a jurisprudência,
mas modulando algo que já é feito por alguns Estados. "Se é possível
apurar o que é real, e é possível porque Estados editaram lei nesse sentido,
não se pode tributar em definitivo o presumido", enfatizou. Barroso
afirmou ainda que não vê riscos ao sistema.
A
lei de São Paulo referida pelo ministro Barroso e a lei de Pernambuco, que
também trata do sistema de restituição, foram objeto de duas ações diretas de
inconstitucionalidade (Adins) paradas desde 2010 para serem julgadas em
conjunto com o recurso em repercussão geral analisado ontem. Para as Adins,
porém, faltava o voto do ministro Barroso e ele se manifestou pela
constitucionalidade de ambas.
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