Por Joice Bacelo
Fonte: Valor Econômico
Indústrias do setor
já obtiveram sentença e liminares contra o Decreto nº 8.393, de 2015
Empresas
do setor de cosméticos estão conseguindo reverter, na Justiça, os efeitos do
Decreto nº 8.393 que equiparou estabelecimentos atacadistas a industriais para
a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A norma foi
publicada pelo governo federal em abril do ano passado como parte do pacote de
ajuste fiscal anunciado pelo então ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Sob
os efeitos do decreto, empresas de um mesmo grupo econômico, por exemplo,
teriam de recolher o imposto na saída dos produtos das fábricas para os seus
estabelecimentos de comercialização e também na saída das mercadorias desses
estabelecimentos para os varejistas. A União projetava, somente com a alteração
do IPI dos cosméticos, elevar a arrecadação de R$ 381 milhões para R$ 653
milhões a partir deste ano.
O
Boticário foi uma das primeiras empresas do setor a conseguir sentença
favorável à invalidação dos efeitos do decreto. Ao analisar o caso, o juiz
Friedmann Anderson Wendpap, da 1ª Vara Federal de Curitiba, destacou três
pontos principais. O primeiro que foi citado trata da forma como se estabeleceu
a equiparação. Para o magistrado, só poderia ser feita por meio de lei complementar
e não por decreto, como no caso em questão. Ele considerou ainda que a
equiparação do comerciante atacadista ao industrial deturpa o próprio imposto
que se quer cobrar ¬ já que esse tipo de estabelecimento teria como função
somente a de comercializar os produtos adquiridos. A incidência de IPI, nesse
caso, demandaria que a empresa realizasse alguma das etapas de
industrialização.
E,
por último, destacou a situação de dupla tributação. "Merece acolhida o
pleito da impetrante [empresa] de reconhecer a ilegalidade e
inconstitucionalidade ao tributar a saída do estabelecimento industrial e a
saída do estabelecimento a ele equiparado", afirmou o juiz em sua decisão.
Segundo o magistrado, a pretensão do Fisco de cobrar pelas duas operações viola
o princípio da isonomia, previsto na Constituição Federal, e também a norma
descrita no artigo 4º da Lei nº 7.798, de 1989 ¬ que trata sobre os produtos
sujeitos ao imposto.
"Se
prevalecesse uma legislação como essa, o que se teria, na verdade, é a
transformação do IPI em um ICMS federal. E a União não tem competência para
cobrar ICMS", diz o representante de O Boticário no caso, o advogado Júlio
Oliveira, do escritório Machado Associados.
Outras
grandes empresas do setor conseguiram, por meio de liminares, a suspensão da
cobrança do imposto aos estabelecimentos atacadistas. Entre elas, Natura,
L'Oréal, Nivea, Johnson & Johnson e P&G. Para o tributarista Abel
Amaro, do Veirano Advogados, está havendo a repetição de algo que já ocorreu no
início dos anos 90. Ele lembra que a equiparação de produtos cosméticos foi
estabelecida por uma medida provisória que foi convertida na Lei nº 7.798, de
1989. A norma motivou uma série de ações judiciais assim como desta vez e com
argumentos semelhantes. Por conta disso, afirma o advogado, o governo federal
acabou publicando em 1994 o Decreto nº 1.217, que excluiu os produtos
cosméticos que haviam sido submetidos à equiparação.
"O
decreto de 2015 basicamente inclui o que havia sido excluído pelo de 1994. Eu
acredito que vai se repetir a mesma situação porque o volume de decisões
judiciais do começo da década de 90 foi enorme", diz o advogado. "E o
fundamento continua sendo o mesmo. Como esse episódio ocorreu após a
Constituição Federal, a tendência é pela repetição. Mais e mais empresas devem
ajuizar ações e conseguir decisões favoráveis até que a norma seja novamente
revista", acrescenta Amaro.
Procurada
pelo Valor, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirma, por meio de
nota, que o tema é relevante e está inserido no acompanhamento especial
nacional do órgão. Informa ainda que tem convicção na sua tese de defesa, seja
sob o enfoque da legalidade do decreto, seja no que tange a constitucionalidade
da Lei nº 7.989, de 1989. "A argumentação suscitada pelos contribuintes
não se sustenta, fiando-se a tese, dentre outros, no equivocado conceito da
hipótese de incidência do IPI, não o produto comercializado, mas a própria
industrialização ¬ o que atenta contra a literalidade do texto constitucional e
recentes decisões do STJ e STF sobre o tema e na suposta ilegalidade do Decreto
nº 8.393, de 2015, que apenas restabelece a incidência de IPI nos moldes da Lei
nº 7.798, de 1989".
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