A mudança no sistema unificado de tributação para pequenas empresas (Simples), em tramitação no Senado, beneficiará comércios altamente lucrativos e profissionais liberais bem remunerados.
Em
contrapartida, pode expulsar empresas que operam com baixas margens de lucro
por causa da concorrência com produtos informais, exatamente aqueles que
deveriam ser o alvo do Simples.
A
contundente crítica acima é de dois renomados especialistas em tributação:
Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal, e Marcos Lisboa,
presidente do Insper. Ambos foram secretários do Ministério da Fazenda na
gestão Antonio Palocci (PT).
A
principal mudança do "Novo Simples" é ampliar o limite de faturamento
para empresas que podem desfrutar dos seus benefícios. Pelo projeto, o teto de
adesão ao Simples sobe de R$ 3,6 milhões/ano (R$ 300 mil/mês) para R$ 14,4
milhões/ano (R$ 1,2 milhão/mês). A mudança pode implicar perda de arrecadação
de R$ 13 bilhões em 2017 e de R$ 16,1 bilhões em 2018, estima a Receita.
"Faz
sentido fazer um sistema simplificado para a pequena empresa, mas nada nesse
montante ou dessa maneira", diz Appy. "O Brasil precisa tratar como
iguais quem tem renda igual, senão abre espaço para todo tipo de lobby de
interesses", completa Lisboa.
EXEMPLO:
COMÉRCIO COM MARGEM DE VENDA DE 25%
Considerando
folha salarial de 10% da receita. Números em %
Para
esse tipo de coméricio, empresa fica fora do novo Simples. No caso da receita
de R$ 1,2 milhão/mês, remuneração é negativa
Tributos:
pelo novo Simples, Simples e FGTS; pelo lucro real, ISS, PIS/Cofins, INSS,
FGTS, IRPJ/CSLL
"Os
especialistas que hoje reclamam das mudanças no Simples são portavozes da
Receita, e não da sociedade", rebate Guilherme Afif Domingos, presidente
do Sebrae e mentor do projeto. "Acham que tudo se resolve com reforma
tributária. O problema é que ela não acontece."
DISTORÇÕES
Appy
e Lisboa fizeram cálculos para apontar os problemas do Simples. O mais grave é
que, como o imposto é cobrado sobre o faturamento, e não sobre o valor
adicionado, quanto maior a margem de lucro, maior é o benefício fiscal.
EXEMPLO:
COMÉRCIO COM MARGEM DE VENDA DE 75%
Considerando
folha salarial de 10% da receita. Números em %
Para
esse exemplo, tributação beneficia comércio mais lucrativo
Tributos:
pelo novo Simples, Simples e FGTS; pelo lucro real, ISS, PIS/Cofins, INSS,
FGTS, IRPJ/CSLL
Por
exemplo: dois pequenos comércios com receita mensal de R$ 30 mil, um com margem
de 25% e outro com 50%. Ambos pagam R$ 1.900 de impostos por mês no atual
Simples, mas a remuneração do proprietário (após excluir insumos, salários e
tributos) é de R$ 2.600 no primeiro caso e chega a R$ 10,1 mil no segundo. O
peso dos tributos na renda cai de 72% para 19%.
Para
Appy e Lisboa, outra grave distorção é permitir que advogados, corretores de
seguro e imóveis, contadores, arquitetos e terapeutas ocupacionais possam
participar do Simples em condições especiais. As duas últimas categorias foram
incluídas no "Novo Simples", enquanto as demais já eram beneficiadas.
EXEMPLO:
ADVOGADOS
Considerando
folha salarial e insumos de 10% da receita cada um. Números em %
Para
esse exemplo, tributação beneficia comércio mais lucrativo
*Neste
exemplo específico, a tributação pelo lucro presumido seria mais vantajosa, com
remuneração de 75%
Tributos:
pelo novo Simples, Simples e FGTS; pelo lucro real, ISS, PIS/Cofins, INSS,
FGTS, IRPJ/CSLL
Hoje
um advogado de pequeno porte, com R$ 30 mil de receita mensal, paga 14% de sua
renda em impostos, ante até 27,5% de um funcionário com carteira assinada. Se
esse advogado fosse tributado pelo lucro real, como uma empresa, o peso
atingiria 55%.
Pelo
projeto, advogados com receita mensal de até R$ 1,2 milhão também poderão fazer
parte do Simples. Nesse caso, 51% da sua renda será tributada, acima dos
assalariados, mas abaixo dos 78% a que chegaria no lucro real.
Fonte: Folha de
São Paulo
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