Maioria dos
ministros da Corte concluiu que ICMS não compõe faturamento ou receita bruta
das empresas; governo prevê impacto bilionário nas contas públicas com mudança
da regra.
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu
nesta quarta-feira (15) que o governo federal não pode incluir o Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de cálculo das
contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e para a Contribuição
para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
A decisão da
Suprema Corte terá repercussão geral no Judiciário, ou seja, a partir de agora,
as instâncias inferiores da Justiça também terão de seguir essa orientação.
O PIS e a
Cofins são pagos por empresas de todos os setores e ajudam a financiar a
Previdência Social e o seguro-desemprego.
O modelo atual
de cobrança é complexo e existem formas diferentes de incidência do tributo,
com regime não cumulativo (para empresas que estão no lucro real, que é uma
modalidade de cálculo do Imposto de Renda) e o sistema cumulativo (para
empresas que estão no lucro presumido), além de uma sistemática diferenciada
para micro e pequenas empresas.
Segundo as
estimativas do governo, com a mudança da base de cálculo, a Receita Federal
deixará de arrecadar R$ 250,3 bilhões em tributos que estavam sendo
questionados na Justiça desde 2003.
O julgamento
havia sido iniciado na última quinta (9), mas foi interrompido quando o placar
da votação estava em 5 a 3 contra o governo porque os ministros Gilmar Mendes e
Celso de Mello não estavam no plenário.
Os dois
magistrados votaram nesta quarta-feira. Gilmar votou a favor do governo para
que não ocorresse a mudança na fórmula de cálculo dos dois tributos, mas Celso
de Mello acolheu a orientação da relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, e
votou pela desvinculação do ICMS do PIS e da Cofins.
Acompanharam a
relatora, além de Celso de Mello, os ministros Marco Aurélio Mello, Luiz Fux,
Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. Por outro lado, além de Gilmar Mendes, votaram
contra a exclusão do ICMS da base de cálculo e foram derrotados no julgamento
os ministros Edson Fachin, Luis Roberto Barroso e Dias Toffoli.
Argumentos da
AGU
Ao fazer a defesa do Executivo federal na tribuna do
STF, a advogada-geral da União, Grace Mendonça, alertou que, além dos R$ 250,3
bilhões que o governo deixará de arrecadar com as derrotas judiciais, a
eventual desvinculação do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins também
fará com que o Fisco deixe de obter daqui para frente R$ 20 bilhões por ano.
Ela ressaltou ainda que, com base
nesta fórmula, o governo teria direito a receber R$ 100 bilhões nos últimos
cinco anos.
Decisão pode
reduzir preços
Professor de direito tributário da FGV e sócio do
escritório Tozzini Freire, o advogado Vinícius Jucá afirmou ao G1 que
a decisão do STF de excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins pode
resultar em queda de preços para os consumidores.
Especialmente,
ressaltou o especialista, nos mercados em que há muita concorrência e nos quais
a margem de lucro é apertada, como nos segmentos de alimentos, cervejas e
refrigerantes.
"Em
mercados muito concorridos, sempre que há a oportunidade de reduzir o pagamento
de impostos os empresários utilizam essa margem para baixar os preços de seus
produtos e também para ganhar mercado", avaliou Vinícius Jucá.
Para o advogado
Felipe Alves Ribeiro de Souza, coordenador do núcleo tributário administrativo
do escritório Nelson Wilians e Advogados Associados, o precedente aberto nesta
quartapoderá resultar em mudanças na atual metodologia de arrecadação de
impostos do governo, que tem por base de cálculo o faturamento ou a receita
bruta.
"Outros
questionamentos emergirão a partir do entendimento exarado neste julgamento,
tal como a exclusão do ISSQN da base de cálculo da contribuição social para
financiamento do PIS e da Cofins", destacou o especialista.
Processos
suspensos
De acordo com a assessoria do STF, pelo menos 10 mil
processos estão suspensos no país atualmente à espera da decisão da Corte sobre
o tema. A ação julgada pelos ministros nesta quarta foi proposta pela Imcopa,
empresa do Paraná especializada no processamento de soja.
O julgamento
Os seis ministros que votaram pela desvinculação do ICMS
da base de cálculo do PIS e da Cofins avaliaram que o imposto de circulação de
mercadorias e serviços não compõe o faturamento ou a receita bruta das
empresas.
Os magistrados
que votaram contra o governo ponderaram que o valor correspondente ao ICMS, que
deve ser repassado ao fisco estadual, não integra o patrimônio do contribuinte,
não representando nem faturamento nem receita, mas simplesmente ingresso de
caixa ou trânsito contábil.
Já a União
afirmava que a ação distorcia o conceito de faturamento e receita bruta
definida pela Constituição.
Cobrança do PIS
e do Cofins
Até então, a tributação de PIS e Cofins ocorria sob dois
regimes: o não cumulativo (para as empresas que são tributadas com base no
lucro real) e o cumulativo (para as empresas tributadas pelo lucro presumido).
Havia ainda uma sistemática diferenciada para micro e pequenas empresas.
As empresas que
optavam pela tributação pelo lucro real pagavam 9,25% (1,65% de PIS e 7,6% de
Cofins), mas podiam abater desse percentual o imposto pago por seus
fornecedores por meio de créditos tributários.
Já as empresas
sob o regime de lucro presumido pagavam uma alíquota menor, de 3,65% (0,65% de
PIS e 3% de Cofins). Essa categoria costuma reunir as empresas do setor de
serviços, cujo maior custo costuma ser o de mão de obra e quase não tem insumos
para gerar créditos tributários para compensar o imposto maior. Daí o temor de
que uma unificação de PIS/Cofins faça aumentar a carga tributária.
STF analisa
tema há quase 20 anos
O tema da mudança na base de cálculo do PIS e da Cofins
estava em discussão no STF há quase duas décadas.
Em 2014, os
ministros chegaram a julgar um caso que solicitava a desvinculação do ICMS da
fórmula dos dois tributos e, naquela ocasião, após uma série de pedidos de
vista (mais tempo para analisar o caso), a maioria da Corte entendeu que o
Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços não integrava o faturamento ou
a receita bruta das empresas.
À época, no
entanto, o caso em julgamento não tinha repercussão geral e valeu somente para
uma situação específica questionada ao tribunal. Com isso, outros milhares de
processos que solicitavam a mesma mudança de cálculo continuaram tramitando na
Justiça.
Reforma
Diante da iminência de uma derrota no STF, o governo
federal decidiu ressuscitar o projeto de reforma do
PIS e da Cofins.
A ideia de
unificação dos dois tributos tinha sido apresentada no final de 2015 pelo então
ministro da Fazenda Joaquim Levy como um primeiro passo para a reforma
tributária. A proposta recebeu críticas de empresários e de entidades do setor
de serviços, que alertaram para o risco de aumento dos impostos e de perda de
postos de trabalho.
Na semana
passada, o presidente Michel Temer afirmou que o governo pretende editar uma
medida provisória até o final de março para simplificar as regras do PIS. Outra
MP, segundo o presidente, deverá ser enviada até o fim do primeiro semestre
para ajustar a Cofins.
O ministro da
Fazenda, Henrique Meirelles, também alertou na última semana que a pasta
entregará para Temer, em 30 dias, uma proposta de simplificação do PIS e da
Cofins, e que, somente após esse estudo, é que o governo deverá definir se a
mudança será enviada ao Congresso Nacional por meio de uma medida provisória.
Na ocasião, entretanto, não foram divulgados detalhes da proposta em estudo.
"Por
enquanto, não temos como confirmar se elas [eventual reforma dos dois tributos]
tratarão da unificação do PIS e Confins", disse o Ministério da Fazenda em
nota na semana passada.
Repercussão
Tributaristas e empresários do setor de serviços temem
que as mudanças impliquem em aumento de imposto e gerem mais desemprego.
Segundo
cálculos feitos no ano passado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e
Tributação (IBPT), a unificação do PIS e da Cofins implicará em elevação de
alíquotas e poderá provocar uma perda de cerca de 2 milhões de empregos no
setor de serviços.
O temor dos
empresários do setor de serviços é que uma mudança no PIS/Confins acabe com o
sistema cumulativo, com alíquota mais baixa, usado hoje por empresas em que o
gasto com mão de obra costuma representar o maior custo e não conseguem se
beneficiar do sistema de abatimento de créditos pelo qual as empresas descontam
as compras de insumos dos impostos pagos.
Na última
quarta-feira (8), Meirelles rebateu as críticas de entidades do setor de
serviços e disse esperar que a reforma do PIS/Cofins tenha efeito positivo no
mercado de trabalho, segundo informou o jornal "O Globo".
"Eu não
sei quais são as hipóteses de trabalho para levar à conclusão de que uma
reforma levaria a uma perda de empregos. Não ficaria surpreso se ali estiver
embutido um aumento da carga. Mas o que fizermos será feito para simplificar e
melhorar", afirmou.
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