terça-feira, 28 de março de 2017

Riscos da unificação dos regimes do PIS e Cofins



Por Gabriela Miziara Jajah e Daniel Franco Clarke


Muito se discute a respeito do projeto de iniciativa do Ministério da Fazenda que trata da unificação das sistemáticas cumulativa e não cumulativa de PIS e Cofins, e a criação do conceito de créditos financeiros das contribuições. Apesar de a reforma ser premente, qualquer mudança no regime de apuração de tais contribuições deve vir acompanhada de soluções concretas para a melhora de um dos maiores gargalos tributários do país.

A ideia original do legislador de 2002/2003 com a instituição da sistemática não cumulativa das contribuições era a de criar um tributo sem incidência em cascata, a exemplo do que ocorreria com o ICMS e IPI, com a contrapartida de que as suas alíquotas seriam majoradas, de 0,65% para 1,65%, e de 3% para 7,65% para PIS e Cofins, respectivamente.

Assim, o Estado iria “dar com uma mão”, ao admitir os créditos das contribuições, e “tirar com a outra”, ao elevar as alíquotas da sistemática anterior (cumulativa). Em outras palavras, o contribuinte iria sair no “zero a zero”. Mas não foi isso o que aconteceu. Isso porque a compreensão do que devem ser considerados insumos das contribuições ao PIS e Cofins tem oscilado significativamente.

Inicialmente, o próprio Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve um posicionamento excessivamente rigoroso no conceito dos insumos passíveis de abatimento da base de cálculo das referidas contribuições, reconhecendo-se como tal apenas os produtos inseridos no processo produtivo das empresas, à semelhança do que ocorre com o ICMS e IPI.

Depois disso, a jurisprudência do Tribunal passou a construir um conceito mais alargado, reconhecendo-se como créditos de PIS e Cofins todas as despesas e custos comprovadamente realizados, em paralelo com a legislação do IRPJ.

Queremos previsibilidade e segurança, de modo que, se adotada determinada regra, a RFB não se articule para desconstituir essa premissa

A fase de maturação parece que foi atingida a partir do momento em que se buscou a essência da legislação, ao se considerar como insumos todos os bens e serviços essenciais à atividade de determinada empresa a depender do segmento de atividade considerado.

Muitos dos julgados recentes dessa Corte administrativa, no pós-Zelotes, têm se mostrado favoráveis a diversos contribuintes, a exemplo do que ocorreu no reconhecimento como insumos dos valores desembolsados a título de frete entre estabelecimentos de uma empresa do setor siderúrgico.

Entretanto, ainda que a análise do conceito de crédito de PIS e Cofins tenha evoluído e passado por um processo de maturação, o que pode até gerar expectativa de previsibilidade aos contribuintes na apuração e recolhimento de tais contribuições, fato é que toda evolução que ocorreu nessa seara (inclusive sob a perspectiva da jurisprudência do Carf) está muito aquém das perspectivas dos contribuintes.

O que se vê, no dia a dia, é um desperdício de tempo e dinheiro no procedimento de avaliação e reconhecimento do que seriam os bens e serviços passíveis de gerar créditos de tais contribuições. Diga-se, desperdício inócuo, na medida em que raramente algum contribuinte submetido à fiscalização pela Receita Federal do Brasil (RFB) tendo por alvo as referidas contribuições sai incólume, ante o excessivo rigorismo aplicado pela RFB no reconhecimento dos créditos.

O governo federal, por intermédio de projeto de iniciativa do Ministério da Fazenda, na busca de uma solução para a matéria, que sobrecarrega não só o próprio Carf, mas o Poder Judiciário, avalia extinguir a sistemática cumulativa do PIS e Cofins, ainda aplicável para algumas receitas (telecomunicações), determinados setores (instituições financeiras, seguradoras) e contribuintes submetidos ao lucro presumido, e simplificar a estrutura de tomada de créditos das contribuições na sistemática não cumulativa.

A simplificação proposta se daria mediante o reconhecimento do conceito de crédito financeiro das contribuições, de modo a admitir que quaisquer custos e despesas incorridos pela empresa estejam aptos a enquadrar-se ao conceito de insumos. Nesse caso, o modelo proposto seria implementado inicialmente ao PIS, cuja carga tributária (mensurada pela sua alíquota) independentemente da sistemática de apuração é muito menor que a de Cofins, e, se validado, também seria aplicado à Cofins.

O receio do governo federal na alteração do regime de apuração e recolhimento das contribuições sociais é também arrecadatório, e, por isso, eventual alteração começaria pelo tributo com menor impacto orçamentário.

É claro que esse tipo de iniciativa poderá vir acompanhada de novo aumento de alíquota, sendo um “déjà-vu” da majoração de alíquotas ocorrida por ocasião da implementação da sistemática não cumulativa das contribuições.

Não se quer nesse artigo desenhar o caos que advirá na reconfiguração de tais tributos, sendo sempre saudáveis, e bem-vindos, novos debates e propostas envolvendo a simplificação tributária. Entretanto, o que se pretende é demonstrar que, se criado o instituto do crédito financeiro e novamente instituída a majoração de alíquotas, teremos mais uma vez a mudança de apuração e recolhimento das contribuições sociais, suscetível a lobby de todo o tipo, emendas, ajustes, exceções, regras, sem que, com isso, resolvamos o problema.
Importante ponderar que o problema não é só o famoso custo-Brasil, que retrai investimentos de todo o tipo, mas também um custo para a sociedade como um todo. O excesso de litígios no Poder Judiciário em matéria tributária é extremamente maléfico para o país, sendo o Estado um dos maiores litigantes.


O que queremos é previsibilidade e segurança nas normas, de modo que, se adotada determinada regra (apuração de créditos sobre mão de obra, por exemplo, um dos grandes pleitos do setor de serviços), a RFB não se articule para desconstituir essa premissa, e gerar um contencioso em cima disso.

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